Vibe coding: o que muda (e o que ainda não muda) no desenvolvimento de software

Vibe coding é a ideia de construir software “por conversa”, descrevendo intenções em linguagem natural para que um modelo de IA escreva (e revise) o código. A promessa é acelerar protótipos e abrir espaço para pessoas que não trabalham diretamente com desenvolvimento criarem soluções; o risco é cair numa espiral de baixa qualidade, segurança frágil e difícil manutenção. Entre hype e realidade, vale olhar para onde essa abordagem se encaixa no ciclo de entrega e quais salvaguardas são necessárias antes de colocá-la no coração do produto.

O que é vibe coding 

O termo ganhou força em fevereiro de 2025, associado à programação conversacional: você dá instruções em linguagem natural (até por voz), a IA gera o código, e você interage em cima do resultado. Não é no-code: o código continua central, mas a interface de criação se desloca do teclado para o diálogo. Essa abordagem também destaca um papel mais “diretivo” do desenvolvedor, focado em arquitetura, crítica e revisão de vulnerabilidades, enquanto a IA executa a parte mecânica. 

Relatos do mercado capturam tanto o entusiasmo quanto o ceticismo: há quem veja uma democratização (mais gente capaz de produzir software), e quem aponte limites práticos — da natureza não determinística dos modelos de linguagem até uma possível explosão de bugs e brechas, especialmente em sistemas que exigem confiabilidade rigorosa.

No contexto acadêmico, a discussão aparece como “revolução” com impactos amplos para profissões ligadas à IA, sinalizando que a novidade não é apenas técnica, mas também cultural e organizacional. 

Onde faz sentido usar vibe coding hoje

Prototipagem e Discovery. Para transformar hipóteses em protótipos clicáveis ou spikes de arquitetura em horas, a abordagem brilha. A curva de aprendizado cai e a criatividade sobe, inclusive para áreas não técnicas construírem POCs simples e validarem fit de solução. 

Automação e componentes de formulários. Quando o problema é bem compreendido e repetitivo (ex.: gerar boilerplate, componentes de UI, scaffolds de APIs), a IA economiza tempo sem aumentar muito o risco.

Documentação viva e refatorações guiadas. Descrever intenções e restrições em linguagem natural pode acelerar refactors locais ou explicar trechos complexos, desde que acompanhados de testes robustos.

Nota: qualidade, manutenção e segurança ficam no centro das preocupações — principalmente quando o time “terceiriza” demais o julgamento técnico para a IA.

Onde não faz sentido (pelo menos por enquanto)

Domínios críticos e regulados. Sistemas que lidam com dados sensíveis, requisitos de performance e conformidade rígida não combinam com o “vibe”. O comportamento não determinístico, a variação de resultados entre rodadas e a possibilidade de gerar código enganoso elevam o risco. 

Arquiteturas complexas com acoplamento alto. Mudanças em um módulo podem quebrar outros pontos; aqui, a habilidade humana de raciocinar sobre dependências e trade-offs ainda é central.

O debate que importa: produtividade vs. qualidade (e segurança)

Há quem preveja IAs escrevendo “a maior parte do código” em horizonte curto, mas o contraponto é direto: “quase funciona” não basta quando você se importa com o software. A consequência óbvia de adotar sem freios é um estoque de código frágil, inseguro e pouco compreendido. Mesmo entusiastas apontam que a prática exige vigilância constante, disciplina de testes e guardrails (não é mágica, é engenharia).

Um caminho pragmático para times de produto, engenharia e QA

Se a pergunta é “como experimentar sem queimar valor?”, aqui vai um framework mínimo — incremental, mensurável e com checks de qualidade:

  1. Designe cenários de baixo risco (prototipagem, utilities, scripts internos). Defina critérios mínimos e budget de inferência (tokens/infra) por tarefa.
  2. Versione prompts e contexto como artefatos do repositório. Trate-os como código (branch/review/history).
  3. Teste antes de confiar. Exija cobertura automatizada, property-based testing e testes de contrato. No test, no merge.
  4. Gates de segurança em CI/CD. SAST/DAST, SBOM e verificação de licenças por padrão. Erros críticos bloqueiam merge.
  5. Observabilidade desde o dia zero. Telemetria, limites de custo/latência e feature flags para desligar rotas geradas por IA.
  6. Arquiteturas modulares. Menos acoplamento → menos efeito cascata de regressões da IA; a própria literatura recente sugere esse rumo.
  7. Responsabilidade clara. Código gerado por IA precisa de dono humano — com revisão e accountability explícitas.
  8. Métricas de decisão. Acompanhe lead time de protótipo, densidade de defeitos, achados de segurança por KLOC e custo por entrega (tokens + compute).

Impactos organizacionais: papéis, carreira e upskilling

Mesmo que a IA assuma a parte mais “mecânica” de escrita, a curadoria técnica continua insubstituível: definir arquitetura, quebrar problemas, modelar dados, pensar em resiliência e governança. Times tendem a migrar do “digitar código” para dirigir processos e decisões — desenhando prompts eficazes, avaliando riscos e orquestrando agentes/ferramentas. O resultado provável é menos demanda por tarefas medíocres e mais seleção por julgamento e acoplamento com o negócio.

Para concluir: entre hype e disciplina

Nem apocalipse dos engenheiros, nem panaceia. Vibe coding pode ser um acelerador de ciclo, especialmente em protótipos e escopos controlados, desde que venha acoplado a práticas fortes de QA, segurança e arquitetura. Se a sua organização quer experimentar, comece pequeno, meça tudo e trate a IA como ferramenta dentro de um sistema de engenharia, não como atalho para pular etapas. É assim que se captura a velocidade sem sacrificar confiabilidade.

Fontes: Olhar Digital, WIRED, Jornal USP

 

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